A Creche como um lugar promotor de Saúde
A consideração da subjetividade do bebê como uma ferramenta formativa na educação infantil: o uso da Metodologia IRDI.
Acompanhamos o aumento pela procura por creches ou de Centros de Educação Infantil no Brasil nas últimas décadas. Sabemos também, por meio de estudos em várias áreas, que a primeira infância é um período precioso do desenvolvimento infantil: é a época da neuroplasticidade cerebral na qual as conexões neurais se formarão a partir da interação do bebê com o meio ambiente, que inclui os humanos. É neste período portanto, que se estabelecem as bases para o funcionamento do aparelho mental.
Considerando esses dois aspectos – a entrada cada vez maior de bebês nos centros de educação e a importância das interações humanas para a construção do aparelho mental – um grupo de pesquisadores propôs um conjunto de procedimentos de intervenção denominado Metodologia IRDI (Indicadores de Risco ao Desenvolvimento Infantil) para uso nos Centros de Educação Infantil. O IRDI é um conjunto de 31 indicadores construídos a partir de quatro eixos teóricos considerados fundamentais para a constituição do psiquismo, ou do aparelho mental, e é deles considerado uma expressão fenomênica (Kupfer et al., 2009). O IRDI foi proposto inicialmente, para uso pelos pediatras e, portanto, foram adaptados para uso com as professoras nos Centros de Educação Infantis.
Por que foi proposta está adaptação?
Parte-se da concepção de que a professora pode trabalhar na direção de manter em andamento a constituição da subjetividade, iniciada pela mãe ou por quem cuida do bebê. Desta forma, além das funções de cuidar e educar, já certamente bem discutidas no campo educacional, destaca-se que a professora de creche também participa do processo de humanização do seu pequeno aluno: o ambiente da creche é um espaço privilegiado para o trabalho de promoção pensada como a garantia das condições mínimas para que se instaurem as estruturas que dão suporte ao funcionamento psíquico (Mariotto, 2009).
Como seria essa intervenção subjetivante da professora proposta na metodologia IRDI?
Em primeiro lugar, as observações dos bebês por meio dos IRDIs não devem ser feitas pela professora, mas por um outro profissional, geralmente a coordenadora ou orientadora (que precisarão conhecer o IRDI, ter uma formação para o seu uso). O IRDI Não é autoaplicável pelas professoras.
Em segundo lugar, por meio dos IRDIs, a coordenadora ou orientadora, acompanhará como se dá, o que chamamos de laço entre a professora e cada um dos bebês que está sob o seu cuidado. Trata-se de um exercício de colocar em cena, valorizar, destacar esse trabalho, que citamos acima, de sustentação e continuação da subjetivação do bebê. Por isso, é fundamental que ocorram conversas das professoras com esse profissional para que, o que ocorre entre a professora e cada bebê seja posto em pauta, discutido.
São indicadores que podem ser acompanhados do lado do bebê, apontando as expressões que indicam que o bebê está caminhando no seu desenvolvimento subjetivo e do lado da professora, as interações que ela pode estabelecer com esse bebê visando promover a sua subjetividade. São interações que podem ser exercidas, por exemplo, nos momento dos cuidados, como na troca de fraldas que é justamente uma ocasião muito fértil para a estruturação psíquica dos bebês: é ali que a professora fala com ele, brinca com ele e lhe dirige a palavra de modo particularizado (Kupfer et. al, 2012). Outro momento importante são as trocas de linguagem carregadas de musicalidade – a musicalidade está presente na forma particular que os adultos se endereçam aos bebês e que transmite não só a sonoridade das palavras, mas a musicalidade da fala. Nesses momentos, a professora estará ocupada em ouvir as vocalizações dos bebês como sendo o princípio da comunicação e as bases para o nascimento das futuras palavras.
São 31 indicadores que entrelaçam o bebê e a professora, ora são apreendidos do lado do bebê, ora do lado da professora e destacam que a professora, na sua rotina, necessita de momentos (simples e pontuais) de contatos corporais, de palavras, de afeto e de endereçamento, particulares com cada bebê.
Maria Eugênia Pesaro
Psicóloga; Psicanalista; Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pelo Instituto de Psicologia da USP; Sócia membro da equipe do Lugar de Vida – Centro de Educação Terapêutica; membro do Grupo Nacional da Pesquisa Multicêntrica IRDI, membro do grupo de pesquisa Metodologia IRDI nas creches. Contato: e-mail: meugeniapesaro@gmail.com